11.6.13

REC [ Fernanda ]

O barulho de suas asas se arrastava no assoalho velho.
O rio negro estendido sobre suas costas quase cobria toda a vastidão celeste que lhe acompanhavam em procissões pagãs.
Entediada numa página datilografada mal escrita.
Ateus, santos, um a um atentamente cortejavam a sua sentença.
Ela precisava ir, mas o seu quarto lhe engolia.
O som do Walkman se confundia com o zunido de suas sinapses avulsas.
Dois, três, quatro dúzia de livros em PDF não lhe interessavam.
Mas ela havia jurado.
Havia julgado o silencio torpe que estendia-se sobre a parede de sua pele.
Forjada à golpes de abraços que já não existiam mais.
Mas viviam estáticos na função REC de seu gravador de fitas.
Toda uma civilização de lembranças inacabadas.
Pessoas inventadas circulavam em sua cabeça sem pedir licença.
Rostos turvos, vozes em estéreo.
Monopolizando os seus ouvidos.
Com canções pop dos anos 90 fazendo jornada em suas veias.
Mas ela havia jurado.
Havia chegado tão perto.
Que a lua invadia a fresta do seu corpo.
E havia tanto tempo em suas orações despudoradas.
Todo o templo que fosse necessário.
Mil novecentos e noventa e quatro!
Passavam em seus olhos negros como o dia mais ensolarado de uma tarde.
Que verão seus lábios vermelhos escorrendo na taça de vidro.
Cuidado! Este lado para cima!
Faltam quinze minutos para a sessão das quatro e dez.
Em surtos episódicos de toda essa ambivalência.
Porque as músicas mais lentas sempre ficam no final dos discos?
Você só precisa prolonga-lo.
Você não precisa disso.
O escuro é tão convidativo.
Um dos deuses mais lindos!

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